segunda-feira, outubro 24, 2005

Something para recordar


Em breve se completarão 4 anos sobre a morte de uma das mais extraordinárias personalidades do panorama musical mundial – este par de meses que aí vem está fatalmente assinalado – George Harrison.
Conhecido como o “Beatle tranquilo”, e parecendo viver um pouco na sombra de John e Paul, deixou sempre bem vincada a sua importância no seio do seu grupo. Guitarrista dotado, foi, na minha opinião, um pouco subestimado pela crítica, talvez devido ao seu carácter reservado ou à sua pouca exuberância musical, por sempre ter privilegiado o grupo, escusando-se a sobressair. As suas intervenções nas entrevistas colectivas, são disso esclarecedoras. Contudo, nomes como Dylan ou Eric Clapton faziam parte da sua legião particular de admiradores.
Foi essa sua personalidade muito virada para o transcendental e a meditação que o levou a estabelecer laços com o Guru Maharishi, um místico indiano, que o iniciou, e aos restantes membros do grupo na filosofia Krishna, que seguiu até ao fim da vida. Das incursões que então fez à Índia, tem marca a sua música, na qual a cítara foi introduzida –por exemplo, na faixa Within’ you, Without you, do álbum Sgt. Peppers – e um amadurecimento, uma espécie de libertação, em termos musicais.
Se até então já tinha escrito algumas canções notáveis, como If I needed Someone, ou Taxman, foi a partir daí que surgiram as suas criações mais notáveis, das quais While my guitar gently weeps, no White Álbum, dava já a verdadeira dimensão do grande guitarrista que George era


No entanto, o grupo caminhava para o seu fim, que não chegou sem que George tivesse escrito, aquele que ficará, talvez, como o seu verdadeiro hino, Something, uma canção de amor com um lirismo quase incomparável.
George era um homem de convicções e solidário. Não lhe bastava falar da guerra, da fome. Para ele, os actos eram mais importantes, e a miséria era-lhe pesada. O horror que ocorria em princípios dos anos 70 no Bangladesh tocou-lhe especialmente, e comovido pelo apelo do seu amigo Ravi Shankar em favor dos refugiados bengalis, decidiu organizar um festival de beneficência no Madison Square Garden, de Nova York, cujas receitas reverteriam para as vítimas da catástrofe.
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Teve, para a ideia, o apoio de músicos como Eric Clapton e Bob Dylan– dois dos seus grandes amigos de sempre – Badfinger, Leon Russell, Ringo Star, Billy Preston e o próprio Ravi Shankar, um virtuoso da cítara, e dos dois espectáculos ficou um álbum triplo magnífico. Terá sido esse o percursor dos concertos Live-Aid.
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A sua carreira a solo foi intermitente, passando vários anos sem gravar, para tristeza dos seus indefectíveis, embora com trabalhos assinaláveis como o triplo All things must pass, Cloud Nine ou o póstumo, Brainwashed, e também os dois álbuns que gravou em 1988 e 1990, integrado no grupo Traveling Wilburys (já aqui falei em pormenor desse belo projecto), do qual faziam parte Roy Orbison, Jeff Lynne, Bob Dylan e Tom Petty, o primeiro dos quais,último disco em que colaborou Roy, é uma verdadeira pérola.
Descuidada, porém, nunca foi a sua faceta filantrópica, assumindo-se sempre como cidadão do mundo consciente e irmão.
Foi um dia muito triste, aquele em que soube da sua morte, embora já fosse esperado. Afinal, foi ao som da sua guitarra que decorreu a minha adolescência.
Mas ficará sempre Something que o recordará


George2

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