quarta-feira, setembro 07, 2005

Quando a ambição é bem-vinda

Costumo dizer que neste mundo já nada me espanta. Exagero. Com alguma regularidade, aparece uma ou outra surpresa para abalar estas minhas certezas.
Uma das mais recentes foi-me proporcionada por um músico norte-americano, Sufjan Stevens.
Sufjan é um músico extremamente dotado, com escola erudita e raízes folk, tendo começado há poucos anos (é novo) a fazer-se notado. Em 2003 surpreendeu a cena musical ao anunciar que tencionava fazer um álbum dedicado a cada um dos estados norte-americanos, começando pelo da sua origem, o Michigan, e que se intitulou “Greetings from Michigan the Great Lake State”.Tratou-se de uma obra de grande fôlego, onde Stevens fazia


Flint (For the Unemployed and Underpaid)





um retrato musical e descritivo da sua terra, decomposto em 15 faixas onde, ao mesmo tempo fazia alarde do seu talento como executante (toca ao longo do álbum mais de 20 instrumentos), o que seria um bom augúrio para o que prometia.
Mas são 50 os estados norte-americanos, e como dizia há uns tempos atrás com alguma graça a revista Uncut, nem os Yes ou os Magma, nos seus tempos mais produtivos, teriam expectativas que os levassem tão longe. Eu acescentaria, que nem Frank Zappa, de quem pouca gente terá toda a discografia, e eu que sou um Zappista de sempre, tenho algum conhecimento de causa.
Com efeito, num tempo em que a maioria dos músicos (ou grupos), demoram normalmente ano e meio a dois anos (quando não mais) a ultimar novo trabalho, propor-se um tal empreendimento, pareceu-me pretensioso e de uma ambição quase delirante.
Para mais, no ano seguinte lançou um álbum fora desta sequência, “Seven Swans”, este mais intimista, cheio de pequenas canções de amor e fé na vida, cantadas num tom quase confessional, que encanta à primeira audição.

41188070_3adf5072e9_o.jpg

Mas este ano, Sufjan voltou à tarefa que se tinha proposto, e editou um álbum dedicado, desta vez, a Illinois, um estado com um peso enorme na música note-americana, afinal é onde se situa a Motown. E se o álbum dedicado ao Michigan era de qualidade superior, desta vez Stevens excede-se e percorre o estado, tocando-lhe os tons e os sabores. Porque a música dele é perfumada, plena de tonalidades. As teias musicais, que combinam o folk e no pop na medida exacta, deixam sons suaves a pairar no ar. As suas líricas vão buscar inspiração, tal como no álbum dedicado ao Michigan, às suas paisagens, aos habitantes, a nomes que fazem a história do estado, como o serial-killer John Wayne Gancy, ou AlCapone, parecendo-nos por vezes que estamos a ouvir uma pequena opereta, dividida em 22 pequenas, mas extraordinárias, peças delicadas e sedutoras.

Concerning the UFO Sighting near Highland, Illinoi’s




Continuo apreensivo quanto à possibilidade de Sufjan conseguir concretizar o que se propôs. É que à média de um álbum por ano, ser-lhe-iam necessários ainda mais 48 para atingir o desiderato. Mais complicado ainda, porque manter um nível a rondar a excelência, é difícil, mesmo para um sobredotado como Stevens demonstra ser a cada novo trabalho.
Mas enquanto nos for presenteando com preciosidades destas, perdoe-se-lhe a ambição, ou a extravagância de uma expectativa quase irrealista.

Nota: Extremamente curiosos alguns títulos, bem demonstrativos da sempre presente criatividade de Sufjan. Um exemplo : “A conjunction of drones simulating the way in which Sufjan Stevens has an existencial crisis in The Great Godfrey Maze


(Para ouvir a segunda música, basta desligar a primeira)

1 Comentários:

Blogger IGirl diz que...

Só não tenho o Michigan(que desgraça), mas adoro o Illinois.
E o Seven Swans quando saiu também me maravilhou.
O Sufjan Stevens é muito, mas muito talentoso :)

7:42 da manhã  

Enviar um comentário

<< Home